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Este alagoano de São José da Tapera, nascido em 1966, é maravilhado com a escrita e encantado com as letras. Procura traduzir em seu trabalho as inquietações da alma humana em suas relações interpessoais e consigo mesmo. Autor dos livros: O homem que virou calango (contos); Retratos Urbanos; Síndroma de Imunodeficiência Depressiva; Da dor do não, poemas; coautor de Caoticidade Urbanopoética do eu nulo, poesia; participação na 1ª Antologia da Confrafia: Nós, Poetas.

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

Vendedor de DVD


               Um matutim lá dos cafundó do Juda gosta muito de filme americano e para sobreviver vende dvd pirata na cidade. Quando vão comprar o filme ele conta logo tudo. Como é o filme, quem é o artista e quem é o bandido. Tem gente que nem compra mais, depois de ouvir toda a estória desde o início até o, como ele mesmo diz, “dé endi”.
                _ O dvd é o mermo preço ainda?
                _ Premero, como me ensinaro na iscola, a gente diz gódi monin. Oraitxe?

                _ Ó, seu abestado. Se tu vinhé cum essas fala, essas coisa, esses palavróro miserento, pode dizê, que’u vô arredá o pé daqui agorinha mermo. Nóis é tudo do mato, até tu que é fi de Marinita, aquela frebrenta que veve beben’o na minha budega e nunca me paga.
                _ Oraitxe. Mas essa estora de não pagá num é cumigo. Quem bebeu foi ela. Oraitxe? Pode escolhê o filme que quisé, proque se não tivé eu mando fazê na hora. Oraitxe?

                _ Continua o mermo preço?
              _ Trei dvd é faive dolari, meu patrão.

                _Oxi! Agora danô-se. Num intendi nada.
                _É faive dolari, meu patrão. É cinco real. Ói, tenho dvd brasilêro, francei, italiano, ingrei e de putaria. E é tudo originá.
                _Vôte! Cum’é que pode sê originá se é pirata?

                _Vô te expricá. Num tem muita diferença não. Pirata é quan’o o filme é copiado dos computadô. O caba vai lá nos  computadô e grava o filme. Já o originá é diferente. É quan’o o dvd é copiado do originá. Gravado do computado é pirata; gravado do originá é originá. Óraitxe?

                _Num sô crente prá tá oraitxe o tempo todo.
                _Eu preguntei se tu tá intenden’o. Ô matuto burro, num intende nada de ingrei. Ó, me diz uma coisa: tu gosta de qual filme?

                _Eu gosto muito de faroeste.
                _Oxe! Hoooomi, tu ta muito atrasado. Isso é do tempo do ronca. Num se faiz mais esse tipo de filme não. O negoço agora é friquição científica. Oraitxe?

                _Frequi o quê?
                _ Friquição científica. Aqueles filme que tem nave do espaço, aquelas coisa do outro mundo, outros praneta. Tem aqueles bicho anssim que não é nem boitatá, nem fogo corredô. É aqueles bicho arieninja. É coisa muito mais escalafobética. Oraitxe?

                _Num gosto disso não. Tem muita mintira.
                _Oxe. É bom demais, home.
             
                _Deixa eu te fazê uma pregunta: us piqui ingri?
             
                _O que, homi? Que bobônica é isso? Que palavrão da boba serena é esse?
             
                _Us... piqui... ingri... eu tô preguntan’o se tu intendi ingrei.

                _Oxe! Num sei nem o portuguei, avali o ingrei. Proquê?

                _Proque o bom mermo é assistí em ingrei. Premero que eu num sei lê rápido aquelar letrinha. Depois a dubrage as veiz num é boa. E quan’o cê tá lendo ar letrinha num dá tempo de vê as figura e quan’o tá ven’o as figura num dá tempo de lê ar letrinha. Ainda por cima me dá dô de cabeça e num dá tempo de vê o artista brigan’o com o bandido. É por isso que eu só assisto o filme em ingrei. Oraitxe?

                _Oxe! Ó, o matuto. E tu intendi?
                _As veiz num intendo argumas palavra, mas aí é só óia a cara do artista e vê as careta prá intendê.      

                 _E tu intendi tudo que se diz no filme?
                _É craro que num intendo tudo. Mas dá prá fazê uma meia-sola. Por exemplo: num filme de briga quan’o o bandido leva um coice que tora o pau da venta o qué que ele diz.

                _Oxe! E eu lá sei.
                _Ele grita na hora da raiva: foca íu! Foca íu! Aí eu pregunto: o que qué dizê?

                _Como é que vô sabê.
                _Ele diz: fi de rapariga.

                _Vixe! Num sei se é isso não. Mintira da bixiga, home.
                _É craro que é. Deixa eu te expricá. Quan’o cê tá numa briga e leva um murro na cara o qué que cê diz.

                _Oxe! Grito logo: fi de rapariga, vô de torá no meio feito palito de foscri, fi da gota serena.
                _Num te dixe! Num te falei! Fi de rapariga. Tu tem que intendê o seguinte. É que lá na língua dos ingrei as palavra num é ingual a nossa. As veiz ela diz uma coisa, mar num é essa coisa é outra coisa que ela qué dizê. Leruaitxe? Intendesse?

                _Oxe! Intendi nada, não. Mar vamu lá, diga outra prá vê se eu acerto.
                _Quan’o o artista pega a artista no braço, enrrola ela ansim feito cobra, óia no zoio dela, mela os beiço de cuspe e fala “ai lovi”.

                _Oxe, facim, facim. Só pode sê: tô doidxo prá te cumê.
                _Ô peste burro. Isso num é filme de putaria não. Preste atenção a pronunça: ai-ló-vi... fazendo biquinho anssim... ai-ló-vi... ele tá dizen’o “eu amo-le”.

                _Oxe, home! Isso é muito compricado. Aprefiro o meu portuguei mermo que a gente diz o que é e acabô-se.
           _Ós pequi ingri, leruaitxe.

_ E agora o que foi?
            _ Que filme que tu qué?

_ Me dá de putaria mermo. Pelo meno num tenho que vê ar letrinha e intendo tudo.
            _ Homi cum homi, mulé cum mulé ou mulé cum home?

_ Tem que tê mulé e homi. E bote num saquim prá minha mulé num vê.
            _ É faive dolari.

_ Tome aí teu dolari.
            _ Muito tânquiu.

_ Ai dento.